Expectativa pela alíquota do IBS, impactos econômicos e efeito confisco
- Judcer

- 16 de ago. de 2023
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Com a apresentação do texto base da Reforma Tributária somada ao estatuto que promete simplificar as obrigações acessórias, que são as declarações prestadas pelos contribuintes ao fisco, a grande expectativa agora se reserva ao que o texto promete ficar a encargo de lei complementar.
Todavia, ainda não tendo se insurgido por ora a tão aclamada lei complementar, até pelo fato de o Projeto de Emenda Constitucional estar neste momento sob a aprovação do Senado, muitos conteúdos já vêm sendo produzidos em enorme escala, visando deduzir quais os percentuais das alíquotas de IBS (Imposto sobre Operações com Bens e Serviços) e CBS (Contribuição sobre Operações com Bens e Serviços).
Será tomado como sombra do conteúdo aqui escrito para reflexão, os ditos de Bernard Appy, Secretário Extraordinário da Reforma Tributária, em trecho retirado do sítio da Câmara dos Deputados Agência Câmara:
“O secretário extraordinário da reforma tributária, Bernard Appy, disse aos deputados do grupo de trabalho que analisa a proposta na Câmara que caso o Congresso decida dar um tratamento diferenciado a alguns setores em relação ao novo Imposto sobre Bens e Serviços (IBS), a alíquota terá de ser maior para os demais setores. A alíquota do IBS hoje poderia ser de 25% porque a ideia é manter a carga tributária sobre consumo. "Quanto mais exceção tiver, quanto mais setores favorecidos, maior terá de ser a alíquota para os demais setores para manter a carga tributária", alertou o Appy” Fonte: Agência Câmara de Notícias.
O setor de serviços, especialmente, sofre antecipadamente em vista de uma provável realidade tributária muito diferente com a reforma em comparação à atual, isto pela carga tributária prevista na PEC sugerir que o setor arcará com uma alíquota “cheia” de IBS, imposto este que será a fusão do ISS e do ICMS. Todavia, ainda não há tanta assertividade quanto a exatidão desse percentual até o momento.
Entretanto, não parece muito inteligente que o setor seja sobrecarregado com a aplicação de uma alíquota desproporcional, isto pelo fato de o mesmo possuir representatividade expressiva na economia do país. Segundo pesquisa da Agência Brasil, o setor cresceu 4,7% no primeiro semestre de 2023.
O setor de serviços representa 70% do PIB brasileiro, sobrecarrega-lo tributariamente significa indubitável afetação à estrutura econômica do país. Para ser mais direto que isto, diga-se: onerar significativamente o setor de serviços significa desestabilizar a economia.
Quando Adam Smith disse que:
"O melhor sistema de recolhimento de impostos sobre mercadorias é embuti-los no próprio produto. Nesse caso, existe a vantagem de “pagá-los sem perceber”, já que “ao comprarmos uma libra de chá, não refletimos no fato de que a maior parte do preço consiste em uma taxa paga ao governo, e por isso pagamo-la de bom grado, como se fora simplesmente o preço natural da mercadoria”. (Smith, Adam. A Riqueza das Nações Vol. I, Nova Cultura, 1996, pg. 34)
Ele de fato estava correto quanto aos tributos incidentes sobre o consumo, no entanto ele complementou no mesmo parágrafo com:
"Além disso, tais impostos têm menos probabilidade de levar o povo à ruína do que os impostos territoriais, pois o povo sempre tem condições de diminuir os seus gastos com a compra de artigos tributáveis". (Smith, Adam. A Riqueza das Nações Vol. I, Nova Cultura, 1996, pg. 34)
Certamente, ao escrever as linhas acima o economista não imaginava o que seria o Brasil dos séculos XX e XXI, e nem mesmo como o fluxo do consumo seria tão alto e em muitos casos mais expressivo que a aquisição de bens imóveis, no que diz respeito a hipóteses de incidências.
Aparentemente, qualquer aumento em carga tributária em hipóteses de incidências relacionadas a condições básicas de sobrevivência pode levar o povo à ruína, especialmente quando essa carga exceder o razoável sobre tais fatos.
Qualquer sistema tributário que não respeite a seletividade ou a essencialidade incorre em injustiça desmedida. Nos termos de Hobbes em seu Leviatã:
“Da igualdade da justiça faz parte também a igual cobrança de impostos, igualdade que não depende da igualdade dos bens mas da igualdade da dívida que cada homem tem para com a república, para sua defesa” (Hobbes, Thomas. Leviatã, Martins Fontes, 2003, pg. 291)
O frenesi de quem tenta prever um futuro catastrófico é mais repudiável que o medo daqueles que acreditam em suas previsões, portanto neste primeiro momento o setor de serviços tenta não acreditar nas previsões, no entanto, o famoso dito brasileiro “em se tratando de Brasil tudo pode acontecer” cabe muito bem no contexto tributário, haja vista o histórico sistema atual chegar ao ponto de contar com emaranhado tão gigantesco de normas, capaz de confundir até mesmo profissionais da área.
Por fim, há ainda a possibilidade de que alíquotas excessivas como as comentadas invadam os limites da moderação, isto é, avançando as margens do efeito confiscatório, o que evidentemente feriria o Art. 150, IV da CRFB/1988.
O princípio da não utilização de tributos com efeito confiscatório talvez não tenha sido tratado com a minúcia devida, nesses mais de trinta anos de Constituição Federal, uma vez que os limites que possam ser considerados como não-confiscatórios se mantém num campo de grave subjetivismo. Isso foi muito bem abordado por Paulo de Barros Carvalho:
“A temática sobre as linhas demarcatórias do confisco, em matéria de tributo, decididamente não foi desenvolvida de modo satisfatório, podendo-se dizer que sua doutrina está ainda por ser elaborada. Dos inúmeros trabalhos de cunho científico editados por autores do assim chamado direito continental europeu, nenhum deles logrou obter as fronteiras do assunto, exibindo-as com a nitidez que a relevância da matéria requer” (CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de Direito Tributário, Saraiva, 2007, 172)
Neste sentido, havendo timidez visível quanto a discussão de tema tão essencial ao Direito Tributário, uma vez tratar-se de um princípio, talvez seja essa a grande oportunidade de estender o debate acerca do que de fato vem a ser o efeito confiscatório na cobrança de tributos pelo Estado, quando da estipulação das novas alíquotas da Reforma.
O fato de o setor de serviços representar 70% do PIB não significa que dele possa se extrair maior fatia de arrecadação aos cofres, ou que nele haja maior capacidade contributiva. No Curso de Direito Tributário Completo, em formato E-Book, de Leandro Paulsen, nas páginas 70 e 71, o Professor e Desembargador Federal expressa sapiência:
“O princípio da capacidade contributiva também se projeta nas situações extremas, de pobreza ou de muita riqueza. Impõe, de um lado, que nada seja exigido de quem só tem recursos para sua própria subsistência e, de outro lado, que a elevada capacidade econômica do contribuinte não sirva de pretexto para tributação em patamares confiscatórios que, abandonando a ideia de contribuição para as despesas públicas, imponha desestímulo à geração de riquezas e tenha efeito oblíquo de expropriação” (PAULSEN, Leandro. Curso de Direito Tributário Completo. Saraiva (E-Book), 2017, pgs. 70 e 71)
Ademais, parece papel fundamental das comissões, organizações comercial e industrial, da sociedade, conselhos profissionais, sindicatos, etc, a participação no momento da implantação dessas alíquotas, pois os reflexos serão percebidos rapidamente na economia.
Na prática, o IBS será o novo ICMS e ISS, com formato unificado e promessa de simplificado, e a novidade demandará conhecimento dos próprios empresários e profissionais relacionados a constituição de preço final de produtos, a fim de que não haja elevação indevida nas etiquetas, assim como erros na formulação dos mesmos, gerando prejuízos às empresas.
Também, esse conhecimento será essencial para, se necessário, promover o debate acerca da existência ou não da hipótese de efeito confiscatório, não somente do IBS, mas também do CBS.
Por: Rodrigo M Cerqueira





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